sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

manhã de céu azul

lembra quando você me disse que queria ser pintora? pois olhe agora pra você, atirada aí no sofá assistindo esses mesmos clipes, veja só, já está querendo chorar outra vez, não, não fica assim, só falei desse jeito porque você deveria estar fazendo alguma outra coisa, olhe: o céu lá fora tão bonito, todo azul, e você nesse sofá com esse casaco de moletom em pleno verão. você tinha dito que se tivesse um tempo sobrando começaria a pintar e passaria o dia pintando porque isso a deixava feliz, mas olha, eu não sou muito bom com essas coisas que a gente precisa falar de vez em quando, não me leve a mal, mas é que não consigo ver você desse jeito. ó, desliga isso e vamos dar uma volta, é só arrumar o cabelo e colocar o óculos preto que ninguém vai perceber, além do mais os gatos estão sem nada pra comer, vem comigo, eu te levo até o banheiro, espera que eu te ajudo querida, não, assim não, minha nossa, não são nem dez e meia da manhã e você já está caindo de tão bêbada, vi que você chegou depois das quatro ontem e já acordou às sete, comeu alguma coisa? eu sabia, levantou e já foi encher a cara e assistir esses mesmos vídeos, vem cá, você sabe que ele não volta, não adianta ficar assim. olha, não sou bom nessas coisas, mas às vezes penso que você nem tenta, nem parece mais você, meu amor, você não era assim, nunca vi alguém tão quieta como você tem andado nesses últimos tempos, e sei que você não era assim, me dizia sempre que tinha motivo pra sorrir todos os dias, e agora me parte o coração ver você assim. vem junto comigo, daí eu te faço algum coisa pra comer, não é bom passar o dia inteiro do jeito que você passa, sabe, não adianta nada ficar assim, já se passaram quatro anos e não adiantou nada, você sabe que ele não volta.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Cretinices

- Cansei.
- De que? - ela perguntou sem desviar os olhos da tv.
- Ah, de tudo e de nada.
- Como assim? Cansou ou não, afinal?
- Esquece.
Não era o momento e ela não era a pessoa com quem eu poderia falar sobre uma coisa dessas. Aliás, também estava cansado dela, dessa vida cretina que ela andava levando. me irritava demais, mas ela não estava nem aí pra nada: as notícias do Haiti, o novo cd da Shakira, o que eu tinha pra falar, o cara da novela que se internou: tudo pra ela era a mesma coisa, ela e aquela cara de tédio. Lembro vagamente de quando a deixei entrar em minha vida, parecia perdida e inocente; assim que se acomodou sob meu teto, virou essa coisa em frente a tv, essa coisa que eu até suspeito às vezes: me despreza.
Um dia pensei em dizer tudo, que a achava uma baita cretina, exigir que me amasse e que olhasse pra mim enquanto eu estava falando - mas eu... eu mesmo não a amava e estava cansado
de ver o céu azul ali fora e não ter pra onde ir
de ter as palavras certas mas não ter o que dizer
de fumar esses cigarros malditos por não ter mais grass
de encher a cara e ir dormir sem nem ao menos dar uma trepada. Sei que tudo isso pode ter uma solução e que no fundo não é culpa dela. acontece que eu observo a vida com a mesma cara de tédio que ela observa as imagens passando na tv.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

IV


ffffound!

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

lovesong

Te mandei um milhão de rosas por sedex e você nem abriu os envelopes pra ver o que tinha dentro. todas murcharam e morreram porque você nem quis saber: leu meu nome escrito à caneta no envelope e guardou no canto das coisas desinteressantes. Uma pilha de envelopes.
também te mandei um pouco de areia que peguei no Sudão e uma folha de caderno com
It's hard to believe that there's nobody out there
It's hard to believe that I'm all alone
Atleast I have her love, the city, she loves me
Lonely as I am, together we cry
*
escrito com minha letra tão tímida. Mandei uma folha dourada que encontrei no Canadá num dia gelado de outono
daquele cogumelo gigante que me cantou um lovesong, mandei uma foto com a minha cara naquele dia e mandei uma foto de cada pôr-do-sol que vi, um pedaço de tijolo da parede que quebrei com um soco, os trechos que mais gostei de cada livro que li datilografados pra você entender bem, uma fita cassete com as músicas que mais ouvi e a capa que desenhei,
garota, te mandei tudo que eu queria ter te dado e você não estava.
Você nem ligou.


(*) Under the Bridge - RHCP

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

sobre partir ou não

O telefone tocou e era a voz dela do outro lado
- Se quiser me ver, aparece lá naquele lugar da outra vez depois do meio-dia.
e desligou.
Estendi a mão até a carteira de cigarros e apanhei um. A voz de Grahan dizia
Something's changing, it's in your eyes
Please don't speak, you'll only lie

enquanto eu o acendia e estendia as pernas sobre a escrivaninha. Observei o céu azul-manhã, as nuvens e o imenso outdoor ali fora. Fazia muito tempo que eu sequer ouvia sua voz. ela tinha dessas coisas: às vezes sumia durante meses, daí voltava e durante um tempo eu a via todos os dias, ela me ligava e convidava para dar uma volta e comer doritos e sorvete, depois sentávamos na beira da calçada e fumávamos sem pressa. Então um dia ela simplesmente não aparecia mais... e passava um dia, dois, mês e eu já sabia que era assim mesmo. Eu só sentia muito medo de que ela não voltasse mais, mas já tinha me acostumado a essa inconstância - ainda assim, continuava acreditando que um dia ela ficaria e que então os dias seriam bons para sempre.
O cigarro estava terminando e eu já sentia vontade de acender outro. Tentei acender, mas o isqueiro parou de funcionar e não quis ir até o fogão. Pensei sobre as nuvens contra o céu flutuando tão brancas até lembrar que ela estava de volta e que a veria novamente. Tomei um banho e procurei a melhor roupa limpa que eu tinha, passei no mercado e comprei uma garrafa de vinho.
Cheguei pouco antes do meio-dia e procurei um banco à sombra - claro que ela ainda não estava lá. Desejei acender um cigarro, mas não vi ninguém fumando por perto. Mudei de posição umas 10 vezes até avistá-la ao longe. O cabelo estava mais comprido e pintado de verde, as roupas estranhíssimas e ultradark - mas eu reconheceria aquele jeito de andar em qualquer lugar. ela já estava bem perto quando percebi que eu estava prendendo a respiração há alguns segundos. Ela disse
- E aí, garoto?
e tirou os óculos escuros, sorriu e me abraçou bem forte. Senti aquele cheiro que só ela tinha
- Por onde tu andou?
- Pelo mundo, por aí, por muitos lugares. e tu?
- Fiquei por aqui mesmo, não fiz nada demais nem fui muito longe.
Quando ela viu a garrafa de vinho, quis logo abrir. Sentou ao meu lado e ofereceu um cigarro enquanto eu tentava tirar a rolha com uma caneta. quando consegui, ela pegou meu rosto entre as mãos e me beijou e eu esqueci do cigarro aceso e da garrafa aberta. Senti aquela pontada de sempre no peito mas ao mesmo tempo me senti tão bem... bem.
- Senti tua falta.
- Isso não é bom. tu sabe que eu... sou assim.
- Eu sei, mas senti tua falta.
- Também pensei bastante em ti.
Ela tinha aquele brilho nos olhos e me fazia sentir bem. não queria pensar que ela não estaria ali para sempre, que sem mais nem menos partiria. Disse-lhe que senti saudade, mas ela certamente não imaginava o quanto. Parecia tão bem e tinha um brilho tão lindo no olhar que eu não conseguia pensar em coisas tristes quando estava ao seu lado.
Certa vez lhe escrevi uma carta com muitas páginas onde eu disse tudo. Levei a carta quando fui vê-la, mas não entreguei. amassei e joguei fora na mesma noite.
- Aqui é o único lugar pra onde eu costumo voltar.
- Só não entendo por que tu some, sabe?
- Eu preciso. Não sei explicar bem, mas eu não posso ficar. Só queria que tu acreditasse que eu gosto muito de estar aqui, mas não posso ficar.
Quis perguntar se não ficaria por mim, mas claro que ela não precisava e estava bem assim. Peguei a mão dela e apertei forte.
- Existem muito mais motivos pras pessoas partirem do que pra ficarem, mas elas sempre acabam ficando. Não consigo ficar, eu não seria eu mesma se ficasse aqui.
e de alguma forma eu pude entendê-la nesse instante, mesmo sem nunca ter partido.

Caio

"(...) claro que você não tem culpa, coração, caímos exatamente na mesma ratoeira, a única diferença é que você pensa que pode escapar, e eu quero chafurdar na dor deste ferro enfiado fundo na minha garganta seca que só umedece com vodka, me passa o cigarro, não, não estou desesperada, não mais do que sempre estive, nothing special, baby, não estou louca nem bêbada, estou é lúcida pra caralho e sei claramente que não tenho nenhuma saída, ah não se preocupe, meu bem, depois que você sair tomo banho frio, leite quente com mel de eucalipto, gin-seng e lexotan, depois deito, depois durmo, depois acordo e passo uma semana a ban-chá e arroz integral, absolutamente santa, absolutamente pura, absolutamente limpa, depois tomo outro porre, cheiro cinco gramas, bato o carro numa esquina ou ligo para o CVV às quatro da madrugada e alugo a cabeça dum panaca qualquer choramingando coisas do tipo preciso-tanto-de-uma-razão-para-viver-e-sei-que-esta-razão-só-está-dentro-de-mim-bababá-bababá, até o sol pintar atrás daqueles edifícios, não vou tomar nenhuma medida drástica, a não ser continuar, tem coisa mais destrutiva que insistir sem fé nenhuma?”



Caio Fernando Abreu

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

À tout le monde

Don't remember where I was
I realized life was a game
The more seriously I took things
The harder the rules became
I had no idea what it'd cost
My life passed before my eyes
When I found out how little I accomplished
All my plans denied

So as you read this know my friends
I'd love to stay with you all
Please smile when you think about me
My body's gone that's all

À tout le monde
À tout mes amis
Je vous aime
Je dois partir
These are the last words
I'll ever speak
And they'll set me free

If my heart was still alive
I know it would surely break
And my memories left with you
There's nothing more to say

Moving on is a simple thing
What it leaves behind is hard
You know the sleeping feel no more pain
And the living are scarred




Apesar de tantos anos passados, eu ainda sei de cor essa letra - como todas as outras do Youthanasia. Daí eu tento entender e não consigo - será só eu que não entendo?: como podemos passar tanto tempo longe de coisas que nunca deixamos de amar. Por que as deixamos em algum lugar que já não é mais? Foi um dos álbuns que mais ouvi na vida, amei cada música ao máximo. talvez o deixei porque ele carrega muitas lembranças - e eu preciso esquecer.
Há tantas coisas não ditas... mas suas auras pairam à minha frente e eu as sinto. guardei naquele quarto escuro todas as coisas que nunca disse, e agora elas me atormentam durante a noite. sei onde deixei as chaves, mas tenho medo de entrar lá e te dizer tudo.
Um dia alguém me disse que ninguém é insubstituível. Fico pensando quando chegará o dia em que eu pensarei assim, se ainda restará um pouco de calor em meu coração. Estou ficando cada vez mais fria - não cruel, isso é quase impossível. mas fria. apagada. distante. Não sou eu assim durante todo o tempo: muitas gargalhadas ouço ao meu redor, muitas coisas bonitas eu vejo, muito me interessam as coisas que leio e a música. E numa manhã chuvosa de segunda, encontrei Muse e foi amor de cara.

If we live a life in fear
I'll wait a thousand years
Just to see you smile again

Kill your prayers for love and peace
You'll wake the thought police
We can't hide the truth inside

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

por enquanto

No jardim das ilusões temporárias eles brincam.
Enquanto brilham as luzes artificiais, todos parecem mais felizes. Acordaram velhos no pântano desgostoso: apagaram-se as luzes.

eu estou na porta.

stagnant

so ain't it funny how, after trying to find my way home
i'm in the middle now and i won't get lost again?



Devin