segunda-feira, 1 de setembro de 2008

De oncinha

Lá vinha Ela. Hoje, ahh!, que delícia ela hoje.
Subiu no ônibus, passou pela roleta e trocou alguns comentários sobre a chuva da madrugada com o cobrador.
07:46 da manhã
Sentou num dos bancos reservados a idosos, bem na frente Dele.

Desde o dia em que a vira pela primeira vez, sonhava com o dia em que ela sentaria ao seu lado.
Mas hoje ela sentou bem na sua frente.
E era um dia quente e as janelas estavam abertas, o vento acariciava aqueles belos cabelos e carregavam o delicioso cheiro até ele. E o doce cheiro causava nele um frisson indescritível.
Estendeu a mão em direção ao cabelo; deixou-a pairando por 2 segundos; recolheu. Pois seria agora que o velho covarde mudaria?
A criança do banco ao lado olhava pra ele e ria.

E a cena foi mesmo tão patética quanto a descrição.

Não sabia sequer o nome dela. Tinha cerca de 30 anos, loira platinada de sobrancelhas escuras obcecada por estampa de oncinha sempre com as roupas menores que o corpo - e era tudo o que sabia. Mas cada detalhe, cada movimento o encantava.
E hoje ela estava radiante, toda em tons dourados: usava um lenço dourado com brincos de argola seguindo a tonalidade e um pingente do mesmo conjunto, blusa bege-claro sobreposta por um casaco com estampa de oncinha, calça marrom mais-que-justa de cima a baixo e sapatilhas de oncinha, óculos de diva dos anos 60 marrom-matizado combinando com a bolsa. E aquela blusa era tão decotada e os peitos tão fartos e tudo tão farto e... era demais pra ele. Sentia como se a qualquer momento fosse ter um treco. Ela o fazia pensar nas mais sujas obscenidades: sentia vontade de afundar a cara no meio daqueles peitos, de puxar aqueles cabelos, apertar aquela bunda com toda força, arranhar, bater, rastejar, morder... só de pensar nisso já sentia uma ponta de vivavidade lá embaixo.
Começou a segui-la há cerca de 10 meses. Cruzou com ela por algum fascinante acaso do destino, num dia em que tinha uma consulta médica de manhã bem cedo. No dia seguinte, foi entregar alguns exames e a viu novamente. Desde então, de segunda à sexta, ele pega o Praia de Belas das 07:44. Virou sua obsessão.

O que o frustrava mais que tudo era o fato de ela nunca ter sentado ao seu lado. Logo ele, que fazia questão de não sentar noutros assentos senão nos vermelhos, sentou em todos os cantos do ônibus pra ver se algum dia ela sentaria ao seu lado - mas parecia que ela nem o via. Teve até um dia em que foi sem a boina e levou um botão de rosa vermelha, disposto a superar a timidez e declarar sua paixão em frente a todos os passageiros. Mas isso foi no dia em que ela encontrou aquela conhecida no ônibus e ficou sabendo da liquidação na Marisa; viu quando ela ligou pro chefe e disse que tinha que acompanhar uma amiga até o HPS e se atrasaria um pouco.
Desembarcou no fim da linha e jogou o botão na primeira lixeira que encontrou.

Descia sempre na parada seguinte à dela. Atravessava a rua e esperava o ônibus que faria o trajeto oposto. Ali terminava sua aventura cotidiana.